O que está por trás dos gritos que as mães dão?

Meu filho só ouve quando eu grito!”

Toda mãe grita, não tem jeito. Melhor gritar do que bater, né?”

Não muito tempo atrás, a mãe que punia os filhos apenas com gritos era considerada um modelo de pacificidade. Hoje, no entanto, a ciência mostra que essa forma de agir pode causar prejuízos às crianças.

O artigo “Childhood Verbal Abuse and Risk for Personality Disorders during Adolescence and Early Adulthood”, publicado na revista científica Research Gate, detalha uma pesquisa feita com 793 famílias nova-iorquinas entrevistadas quando os filhos tinham 5, 14, 16 e 22 anos.

Dessa análise feita durante 17 anos, os cientistas descobriram que filhos que sofreram abuso verbal materno durante a infância tinham três vezes mais chances de apresentar transtornos de personalidade na adolescência e início da idade adulta (como paranoia e transtorno obsessivo-compulsivo) ​​do que aqueles cujas mães não gritavam.

Apesar desse e de outros estudos com conclusões semelhantes, as frases que abrem esse artigo ainda são muito comuns em nossa sociedade. Desde 1990 existe no Brasil a Lei da Palmada, que teve sua redação alterada em 2014, passando a incluir a proibição a “tratamentos cruéis ou degradantes”, gritos aí incluídos.

Entre as mães que ainda defendem essa prática, a justificativa mais comum é que “esse menino é uma peste, só quer me irritar”. Elisama Santos, autora do livro Por que gritamos, falou sobre isso em entrevista ao jornal Zero Hora:

O grito fala sobre mim, não é sobre o meu filho. […] A criança não perdeu a capacidade de aprender de outra forma, mas o adulto perde a capacidade de falar, chega em um limite. As pessoas precisam entender os seus limites, porque eles existem”, analisa Elisama.

O outro lado da moeda

Em contrapartida, muitas mães se culpam por não conseguirem deixar os gritos de lado, o que tampouco é eficaz. Uma pessoa que foi criada à base de gritos – ou pior, de palmadas –, ao se ver, agora na posição de mãe, numa situação de cansaço ou raiva intensa, naturalmente é levada pelo cérebro a agir de acordo com o padrão aprendido.

Isso porque em seu corpo é ativado o modo emergência, de ataque ou defesa, e nem toda teoria do mundo poderá ajudá-la – exceto quando há um esforço consciente para voltar à racionalidade e sair do modo emergência.

Um parêntese: Isso não significa que seus pais foram culpados, eles apenas usaram os recursos que tinham. Provavelmente eles fizeram o melhor possível com as informações que dispunham, tal qual você faz o seu melhor – ou alguém conhece alguma mãe que tenha a intenção de fazer seu filho sofrer?

Aqui, a chave é tomar consciência. Quando a mãe percebe que, apesar de seu desejo em fazer o melhor está prejudicando os filhos de alguma forma, esse é o primeiro passo para começar a agir diferente.

Enquanto escondermos de nós mesmas que sentimos raiva, angústia (ou qualquer outro sentimento ‘ruim’), nada vai mudar. Entretanto, quando aceitamos nossos sentimentos, podemos refletir sobre como é possível agir da maneira que desejamos com os filhos, sem culpas nem tampouco desculpas, que não levam a nada”, considera Marcia Belmiro.

Fonte:

Childhood Verbal Abuse and Risk for Personality Disorders during Adolescence and Early Adulthood”. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/12174305_Childhood_Verbal_Abuse_and_Risk_for_Personality_Disorders_during_Adolescence_and_Early_Adulthood

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